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ARQUITETURA DA ESCOLHA: PAPEL DO AMBIENTE NA TOMADA DE DECISÃO

Por Andréa de Paiva (Arquiteta e Urbanista)



Andréa de Paiva é idealizadora do NeuroAU, membro do Conselho da Academy of Neuroscience for Architecture (ANFA) e vice-chair do ANFA Chapter Brazil. Também é Master of Arts pela Middlesex University em Londres e arquiteta e urbanista pela USP (Universidade de São Paulo). Leia a bio completa no final deste artigo.
Andréa de Paiva é idealizadora do NeuroAU, membro do Conselho da Academy of Neuroscience for Architecture (ANFA) e vice-chair do ANFA Chapter Brazil. Também é Master of Arts pela Middlesex University em Londres e arquiteta e urbanista pela USP (Universidade de São Paulo). Leia a bio completa no final deste artigo.

A tomada de decisão é um processo complexo que ocorre em um ambiente repleto de influências sutis. Ao tomarem uma decisão, as pessoas não agem em um vácuo isolado, mas sim em um contexto onde diversos fatores exercem influência sobre suas escolhas, inclusive fatores específicos do ambiente físico. Este artigo explora o conceito de "arquitetura da escolha", proposto por Richard Thaler e seus colegas em 2009, visando destacar como o ambiente construído desempenha um papel crucial na moldagem das decisões cotidianas [1]. O termo "arquitetura da escolha", cunhado por Richard Thaler, um dos vencedores do Prêmio Nobel de Economia em 2017, refere-se ao design do contexto no qual decisões são tomadas [1, 2]. Já o termo "arquiteto da escolha" se refere à pessoa responsável por criar este contexto. Essa noção transcende o ambiente físico e abrange uma abordagem mais ampla e holística, considerando o espaço, as pessoas e o contexto específico em que estas se encontram.

É importante destacar que as escolhas que fazemos não se limitam às grandes decisões, como a compra de um imóvel. Decisões menores do nosso dia a dia são direta e indiretamente influenciadas pelo ambiente físico. E são justamente essas decisões menores, para as quais damos menos atenção, que podem ter um impacto significativo a longo prazo em diversos aspectos de nossas vidas, incluindo saúde, relacionamentos e desempenho. O ambiente no qual vivemos pode influenciar essas escolhas de maneira notável.


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Um aspecto importante neste contexto é como o ambiente pode ser projetado de forma a incentivar comportamentos mais saudáveis. A arquitetura pode estimular a hidratação ao tornar a água mais acessível e atraente, ou promover a atividade física ao criar oportunidades para a movimentação [4, 5]. Além disso, o design pode facilitar encontros sociais espontâneos, proporcionando interações mesmo para aqueles mais introvertidos. Por exemplo, imagine um ambiente de escritório onde você deseja promover hábitos saudáveis entre os funcionários. Arquitetos e designers podem aplicar a arquitetura de escolha de forma a influenciar positivamente as decisões de saúde dos funcionários. Algumas estratégias que devem ser combinadas para tal resultado são: aplicar o Design Ativo na concepção de layout e acessibilidade, projetando escadas de grande visibilidade e fácil acesso próximas a entradas e elevadores; criar espaços para atividade física, como áreas de descanso ao ar livre ou instalação de equipamentos de ginástica ao redor do escritório; posicionar opções de alimentação saudável em locais de destaque, enquanto opções menos saudáveis estão em áreas menos visíveis; criar sinais motivacionais, com promovendo a importância da hidratação, da atividade física e de uma alimentação equilibrada; e aplicar o Design Ergonômico, incentivando a postura saudável e o movimento adequado e prevenindo o sedentarismo e o desconforto.

Escada Piano, Odenplan estação de metrô em Stockholm, Suécia. Image by KJ Vogelius.
Escada Piano, Odenplan estação de metrô em Stockholm, Suécia. Image by KJ Vogelius.

Em meio a isso, não podemos ignorar que arquitetos e designers têm a capacidade de influenciar significativamente as escolhas das pessoas através do ambiente que criam. Ao adotar uma abordagem de arquitetura de escolha, eles podem incentivar ou prejudicar decisões cotidianas. Através de elementos como layout, cores, sinalização e disposição de objetos, é possível influenciar o comportamento de maneira sutil e positiva.

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Tal indução de comportamentos não deve ser confundida com "coerção" ou "manipulação". Isso ocorre quando uma influência é exercida de maneira que limita a liberdade de escolha da pessoa, forçando-a a agir de acordo com a vontade de outra parte, muitas vezes em detrimento de seus próprios interesses ou desejos genuínos. A linha entre a indução sutil e a coerção pode ser tênue, e o contexto e a intenção desempenham um papel importante na determinação de quando a indução cruza essa linha.


Nesse sentido, Thaler e seus colegas defendem a filosofia do "paternalismo libertário" como uma abordagem para influenciar escolhas sem impor resultados específicos [1]. Isso implica estimular as pessoas a fazerem escolhas que julguem melhores para si mesmas, ao invés de impor uma direção única. A arquitetura de escolha se alinha a essa filosofia, promovendo a autonomia das pessoas.


Embora o termo "paternalismo libertário" possa gerar controvérsias, ele nos convida a considerar a criação de ambientes que promovam hábitos saudáveis e melhores escolhas. O impacto do ambiente nas decisões das pessoas é inegável, e isso nos instiga a refletir sobre quais decisões seriam mais benéficas e como podemos incentivá-las através do design e da arquitetura.


Uma reflexão importante que essa discussão sobre "arquitetura da escolha" traz é que arquitetos e designers desempenham um papel crucial na criação de ambientes que incentivam escolhas saudáveis e autônomas. O ambiente nunca é neutro, ele vai sempre influenciar os seus usuários, quer o arquiteto pense nisso ou não. Então melhor do que ignorar esse fato, é buscar compreender de maneira mais profunda como se dão os processos de tomada de decisão e qual o papel das nossas emoções, das nossas memórias afetivas, da nossa cultura e, claro, do ambiente físico nisso tudo. Arquitetos e designers desempenham um papel crucial na criação de ambientes que incentivam escolhas saudáveis e autônomas.


Ao considerar o poder da arquitetura de escolha, abrimos caminho para uma reflexão importante sobre como podemos criar espaços que promovam decisões positivas para o bem-estar de todos.



Referências:

[1] Thaler, R. H., & Sunstein, C. R. (2009). Nudge: Improving decisions about health, wealth, and happiness.

[2] Landais, L. L., Damman, O. C., Schoonmade, L. J., Timmermans, D. R. M., Verhagen, E. A. L. M., & Jelsma, J. G. M. (2020). Choice architecture interventions to change physical activity and sedentary behavior: a systematic review of effects on intention, behavior and health outcomes during and after intervention. The international journal of behavioral nutrition and physical activity, 17(1), 47. https://doi.org/10.1186/s12966-020-00942-7

[3] Thaler, R. H. Sunstein, C. R. & Balz, J. P.,(2010) Choice Architecture. Available at SSRN: https://ssrn.com/abstract=1583509 or http://dx.doi.org/10.2139/ssrn.1583509

[4] Friis, R., Skov, L. R., Olsen, A., Appleton, K. M., Saulais, L., Dinnella, C., Hartwell, H., Depezay, L., Monteleone, E., Giboreau, A., & Perez-Cueto, F. (2017). Comparison of three nudge interventions (priming, default option, and perceived variety) to promote vegetable consumption in a self-service buffet setting. PloS one, 12(5), e0176028. https://doi.org/10.1371/journal.pone.0176028

[5] Boutelle, K. N., Jeffery, R. W., Murray, D. M., & Schmitz, M. K. (2001). Using signs, artwork, and music to promote stair use in a public building. American journal of public health, 91(12), 2004–2006. https://doi.org/10.2105/ajph.91.12.2004

 

Nossa colunista: Andréa de Paiva é idealizadora do NeuroAU, membro do Conselho da Academy of Neuroscience for Architecture (ANFA) e vice-chair do ANFA Chapter Brazil.


Andréa é Master of Arts pela Middlesex University em Londres e arquiteta e urbanista pela USP (Universidade de São Paulo). Tentando unir pesquisa, educação e design em seu trabalho, seus interesses de pesquisa envolvem o campo interdisciplinar da ciência cognitiva aplicada à arquitetura e ao urbanismo, bem como a teoria da arquitetura, a fim de compreender melhor como o ambiente físico pode afetar os indivíduos e a sociedade. Os principais tópicos de sua pesquisa incluem efeitos de curto e longo prazo do ambiente físico; enriquecimento ambiental e plasticidade cerebral; como o espaço afeta a memorização de experiências; restauração cognitiva; e a experiência multissensorial do ambiente.


Andréa é coordenadora do curso de Interiores & Neurociência: design focado em pessoas no IED (Istituto Europeo di Design), e também ajudou a criar e coordenar cursos de neurociência aplicada aos negócios na FGV (Fundação Getulio Vargas) e, na FAAP (Fundação Armando Álvares Penteado), criou o curso Neurociência Aplicada a Ambientes e Criação, que completou sua 10ª edição em 2022.


Certificada  em Design Thinking pelo Massachusetts Institute of Technology (MIT) de Boston, Andréa também é consultora de NeuroArquitetura, tendo prestado consultorias no Athié Wohnrath (um dos escritórios de arquitetura de maior sucesso do Brasil segundo a Forbes, 2016), onde se envolveu com a aplicação da NeuroArquitetura em diversos projetos escolares e corporativos.  Ela também foi consultora da FGV, o melhor think tank da América Latina segundo o Global Go To Think Tanks Index (2020)  e é colaboradora convidada da pesquisa sobre como o design afeta o comportamento, desenvolvida pelo DPArchitects em Singapura/Londres e financiada pelo Design Singapore Council.

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